Como começou o Jogo do Bicho.
Inventado em 1892
pelo Barão João Batista Viana Drummond, fundador do Jardim
Zoológico do Rio de Janeiro, em Vila Isabel, no Rio de Janeiro, no
Brasil.
A fase de intensa
especulação financeira e jogatina na bolsa de valores nos primeiros
anos da república brasileira imprimiu grave crise ao comércio. Para
estimular as vendas, os comerciantes instituíram sorteios de
brindes. Assim é que, querendo aumentar a frequência popular ao
zoológico, o barão decidiu estipular um prêmio em dinheiro ao
portador do bilhete de entrada que tivesse a figura do animal do dia,
o qual era escolhido entre os 25 animais do zoológico e passava o
dia inteiro encoberto com um pano. O pano somente era retirado no
final do dia, revelando o animal do dia. Posteriormente, os animais
foram associados a séries numéricas da loteria e o jogo passou a
ser praticado largamente fora do zoológico, a ponto de transformar a
capital da república (de 1889 a 1960) na “capital do jogo do
bicho”.
Atualmente, o jogo
do bicho continua a ser praticado em larga escala nas ruas das
principais cidades do Brasil, não obstante ser considerado uma
contravenção pela legislação penal brasileira.
HISTÓRIA
A origem do jogo do
bicho remonta ao fim do Império e início do período republicano.
Jornais da época contam que, para melhorar as finanças do jardim
zoológico localizado no bairro da Vila Isabel, que estava em
dificuldades financeiras, o senhor de terras e escravos João Batista
Viana Drummond criou uma loteria em que o apostador escolhia um entre
os 25 bichos do zoológico.
Cada bicho era
representado por quatro números consecutivos compreendidos entre 00
e 99. Havia 25 bichos numerados de 01 até 25 por ordem alfabética.
Os números de 00 a 99 correspondiam aos 25 bichos conforme uma
progressão aritmética, calculando o próximo múltiplo de quatro.
Por exemplo, o camelo (8) é 29-32, e a vaca (25), 97-00 (hoje, o
bicho correspondendo a um número entre 0000 e 9999 é indicado pelos
dois dígitos finais.). Ao final do dia, os organizadores do jogo
revelavam o nome do bicho vencedor e afixavam o resultado num poste,
o que até os dias de hoje continua sendo feito.
O jogo do bicho
permitia apostas de “simples moedas a tostões furados” numa
época em que a recessão tomava conta do Brasil. Essa modalidade de
jogo, rapidamente, se alastrou pelo país e tornou-se para o pobre
algo comparável à bolsa de valores para os mais abastados. Desse
modo, quase sempre “investindo” com poucas moedas, o apostador
nunca deixava de "aplicar" na sua "bolsa de valores",
o que deu origem à expressão: "só ganha quem joga".
A organização do
jogo de bicho preserva uma hierarquia como a de atores, teatro e
plateia (banqueiros, gerentes e apostadores). Nessa hierarquia, o
"banqueiro" é quem banca a totalidade do jogo e quem paga
a banca. O "gerente de banca" ou do ponto é quem repassa
as apostas ao banqueiro e o prêmio ao vendedor. O vendedor é
agregado ao gerente de banca e é quem escreve e intermedia o
pagamento entre o apostador e o gerente. A banca e o ponto não
necessitam de um lugar fixo para operar: seus funcionários são,
frequentemente, encontrados nas ruas sentados em cadeiras ou caixas
de frutas. Em outras regiões do Brasil, pode-se entrar em contato
por telefone e ummotoboy vem buscar o jogo em sua casa ou trabalho.
O jogo do bicho tem
algumas regras que estipulam limites nas apostas: um exemplo é a
“descarga” de alguns números muito apostados, como o número do
túmulo de Getúlio Vargas ou número do cavalo no dia de São Jorge.
Para alguns organizadores, os números muito jogados são cotados a
fim de evitar a “quebra da banca” tanto por parte das bancas de
apostas como durante a apuração no sorteio. Pelo fato de ser uma
atividade que envolve dinheiro não controlada pelo governo, o jogo
tem atraído a atenção das autoridades corruptas e criou-se um
complexo e eficiente sistema para a realização da venda de
facilidades.
RELAÇÃO COM O
CARNAVAL
A ligação do jogo
do bicho com o carnaval começou por volta dos anos 1930, através de
Natal da Portela. Natal, desde cedo, esteve envolvido com o mundo do
samba já que, no quintal de sua casa na esquina com a estrada do
Portela no subúrbio de Oswaldo Cruz, realizavam-se rodas de samba.
Nesse local, foi fundado o bloco carnavalesco “Vai como pode”,
que se transformaria na escola de samba Portela.
Após perder um
braço por causa de um acidente de trem, Natal perdeu o emprego e foi
trabalhar como apontador de bicho na região de Turiaçu. Em pouco
tempo, virou gerente de banca e, depois, conseguiu montar a sua
própria, vindo a se tornar banqueiro de jogo do bicho, controlando
toda a área de Madureira.
Com a morte de seu
grande amigo Paulo da Portela, Natal, como forma de homenageá-lo,
resolveu investir dinheiro na Portela para que ela pudesse se
transformar em uma grande escola de samba, criando aí a figura do
bicheiro patrono. Somado a suas práticas clientelistas com a
população de Madureira já que, devido a sua infância pobre, Natal
sempre procurava ajudar aos pobres através de doação a igrejas, a
instituições de caridade, pagamento de enterros etc., sua ligação
com o carnaval começou a adquirir prestígio, sendo até mesmo
convidado pelo então ministro Negrão de Lima a apresentar a Portela
para a Duquesa de Kent no Palácio Itamaraty em 1959.
Como forma de se
legitimar perante a sociedade, os demais banqueiros de jogo do bicho
passaram a seguir o exemplo de Natal, vinculando-se às escolas de
samba de suas respectivas áreas de atuação, o que posteriormente
também seria usado, segundo alguns, como forma de lavagem de
dinheiro da contravenção.
CONTRAVENÇÃO
Simples no começo,
o sistema de jogo do bicho multiplicou-se pelo território
brasileiro. Câmara Cascudo, no seu "Dicionário do folclore
brasileiro", distinguia o jogo como sendo "invencível"
e que a sua repressão apenas ampliava sua reprodução por todo o
país. "Vício irresistível", escreveu o folclorista:
"(...) contra ele, a repressão policial apenas multiplica a
clandestinidade. O jogo do bicho é invencível. Está, como dizem os
viciados, na massa do sangue".
Em “Ordem e
progresso” (1959), Gilberto Freyre descreveu o jogo do bicho como
uma das poucas atividades sem discriminação de classes no início
da república. O historiador José Murilo de Carvalho demonstrou em
“Os bestializados: Rio de Janeiro e a república que não foi”
que a sociedade carioca difundia a crença na sorte como uma forma de
ganhar a vida sem trabalhar.
O jogo do bicho é
semelhante a uma loteria federal, mas com algumas diferenças: uma
delas é que o jogador pode apostar qualquer valor, que muitas vezes
é bem acima de suas possibilidades. Quanto maior o valor apostado em
uma sequência numérica (milhar, centena, dezena, etc.), maior será
o prêmio em caso de acerto. Com essa flexibilidade de apostas, o
jogador é livre para escolher pelo menor valor possível o seu
número da sorte nas 10 000 chances disponíveis em cada sorteio.
Exemplo: um apostador joga um real em uma milhar no primeiro prêmio
(conhecido como cabeça por ser a primeira milhar no topo da lista de
resultados). Caso acerte ela inteira (os quatro números), ele ganha
3 000 reais (apostas no estado de São Paulo). Se tivesse jogado
cinquenta centavos na mesma aposta e acertado, o apostador ganharia 1
500 reais. Toda banca (organização que faz a administração do
jogo do bicho) tem uma tabela de valores que são apresentados aos
apostadores, tabela essa que tem muito pouca diferença de banca para
banca.
Os problemas do Jogo
do Bicho com a lei começaram apenas duas semanas depois de seu
lançamento. Assim como hoje, os jogos de azar eram proibidos no
Brasil do século XIX, e todo o tipo de sorteio deveria ser
previamente aprovado pelas autoridades locais. Apesar de ter dado o
sinal verde para a operação do Jogo do Bicho, logo a polícia do
Rio de Janeiro se arrependeu de sua decisão, tendo considerado que o
jogo havia saído do controle, como mostra este informe público do
jornal O Tempo, ainda em 1892:
"Ao Dr. 2º
delegado dirigiu ontem o Dr. Chefe de Polícia o seguinte ofício: No
empenho de procurar atrair concorrência de visitantes ao Jardim
Zoológico, solicitou o seu diretor para certo recreio público
licença, que lhe foi concedida pela polícia, em vista da feição
disfarçadamente inocente que da simples primeira descrição do
divertimento parecia se deduzir. Entretanto, posta em prática essa
diversão, se verifica que tem ela o alcance de verdadeiro jogo,
manifestamente proibido. Os bilhetes expostos à venda contêm a
esperança puramente aleatória de um prêmio em dinheiro, e o
portador do bilhete somente ganha o prêmio, se tem a felicidade de
acertar com o nome a espécie do animal que está erguido no alto de
um mastro. Esta diversão, prejudicial aos interesses dos encantos,
que com a esperança enganadora de um incerto lucro se deixam
ingenuamente seduzir, é precisamente um verdadeiro jogo de azar,
porque a perda e o ganho dependem exclusivamente do acaso e da sorte.
Neste momento
começou a história de problemas do Jogo do Bicho com a lei, que foi
marcada por idas e vindas, até a sua proibição definitiva, em
1941, quando foi passada a lei de proibição dos jogos de azar no
Brasil. Apesar de sua popularidade e de ser tolerado por muitas
autoridades, o jogo do bicho é considerado uma contravenção no
Brasil, de acordo com o artigo 58 da Lei de Contravenções Penais
(Decreto-lei 3 688, de 3 de outubro de 1941). As pessoas que o
exploram são passíveis de prisão e multa e os apostadores são
passíveis de multa.
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